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As guerras memeais entre Brasil e Portugal

Curto&Grosso: Guerras de memes entre Brasil e Portugal expuseram tensões históricas da colonização. Apesar das rivalidades cômicas, é uma chance de entender melhor o passado colonizador-colonizado compartilhado.

Um embate curioso tomou conta das redes sociais em 2016: uma disputa entre internautas brasileiros e portugueses pelo título de “país do humor” na internet. O confronto online aparentava ser uma rivalidade banal ou uma demonstração apaixonada de orgulho nacional e competição. No entanto, as referências extensas à história colonial revelam uma inquietação mais profunda que persiste entre pessoas dos dois países.

A confusão começou quando a conta no Twitter In Portugal We Don’t (“Em Portugal, nós não…”), criada em novembro de 2015, começou a ganhar popularidade ao compartilhar piadas sobre expressões idiomáticas portuguesas. Contudo, observou-se uma forte semelhança com um meme brasileiro que havia viralizado no ano anterior, com o formato In Brazilian Portuguese, we don’t say (“Em português brasileiro, nós não dizemos…”).

Indignados com a imitação, usuários brasileiros iniciaram a chamada Primeira Guerra Memeal, inundando a plataforma com memes zombando dos imitadores portugueses. A disputa culminou com o encerramento da conta @inportugalwe pelo seu dono. Com a sensação de vitória, os brasileiros adotaram a hashtag #PrimeiraGuerraMemeal para destacar sua supremacia em memes.

Segundo estudiosos, como o professor de história Gerardo Majella, as raízes opressivas da colonização europeia deixaram marcas nas culturas e concepções que cada país tem sobre o outro. Essas noções de superioridade ou inferioridade étnica e cultural persistem até hoje de maneira sutil.

Os diversos conflitos impulsionados por memes mostram como os internautas brasileiros lidam com sua identidade em relação ao antigo colonizador. As guerras culturais digitais, embora possam parecer besteiras, podem catalisar conversas reveladoras sobre memória coletiva e dinâmicas de poder interculturais.

"O passado colonial tem forte impacto na cultura brasileira. Apesar de tornar nosso país um local multicultural, trouxe também heranças muito negativas e que impactam até hoje. Quando o Brasil deixou de ser colônia e virou o Império brasileiro, quase nada ou até mesmo nada mudou. Um exemplo disso foi a manutenção da prática da escravidão sendo parte do Brasil até 1888, onde o mundo já passou pela revolução industrial e o capitalismo já não necessitava de mão de obra escrava e sim uma mão de obra paga, que pudesse consumir. Isso gerou um atraso econômico, criando de certa forma uma ‘cultura da miséria’ não só nos ex-escravizados, mas em toda a população marginalizada."
Gerardo Majella

A professora de Letras Lara Ferreira do Vale (30) estudou guerras memeais entre Brasil e Portugal na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ela argumenta que não faz o menor sentido falar de roubo de memes, por estarem presente no coletivo imaginário. A origem obscura dos memes também reforça o seu argumento, segundo Lara. 

Apesar de ter agido como espectadora durante as guerras memeais, ela acompanhou o desenrolar dos confrontos digitais entre os dois países, incluindo um segundo episódio de guerra memeal, ocorrido em 2018.

Durante o fervor da Copa do Mundo de 2018, os brasileiros elaboraram montagens de personagens de animes com as cores da bandeira nacional, em sinal de apoio à equipe nacional de futebol e os compartilhavam principalmente no “X” (Twitter). Nesse “revival” da rivalidade de 2016, os portugueses decidiram replicar um meme popularizado pelos brasileiros, e confrontos cômicos se desenrolaram não apenas com Portugal, mas com outras nações, especialmente aquelas que cruzariam o caminho do Brasil nos jogos ou que eram vistas como ameaça ao tão almejado hexacampeonato. 

Para explicar esse comportamento dos brasileiros, Lara cita o conceito de “carnavalização”:

“O Brasil tem uma rincha com portugueses que se aflora por meio da comédia. Citando Mikhail Bakhtin, lembro-me da ‘carnavalização’ que explica a reação dos brasileiros, porque aconteceram inversões e transgressões simbólicas”
Lara Ferreira do Vale

Os memes compartilhados entre os países expõem questões carregadas, como “devolve nosso ouro” e brincadeiras sobre a “descoberta” portuguesa das Américas, por ser vista como uma invasão.

#ColonizaçãoInvertida

Na internet, a hashtag #ColonizaçãoInvertida ganha força após as guerras memeais contra o Brasil, principalmente no “X” (Twitter). O meme destaca situações em que o Brasil “supera” Portugal na geopolítica global, principalmente na preferência pelo português brasileiro em função do português europeu em filmes, jogos, séries e muito mais.

 

A hashtag chama a atenção pelo seu caráter subversivo, mas o professor Gerardo Majella observa uma valorização do Brasil na geopolítica mundial pelo seu potencial no sistema capitalista:

“O Brasil é um país populoso e multicultural. Assim, empresas estrangeiras costumam dar mais foco ao povo brasileiro pelo conceito capitalista de oferta e demanda. Por sua alta quantidade de consumidores, o Brasil é visto como excelente demanda para o mercado tecnológico e outros meios culturais. Apesar de entender a manifestação, o termo ‘colonização invertida’ soa, de certa forma, inadequado, visto que não se trata de uma colonização mas sim um reflexo cultural e histórico do nosso passado e presente.”
Gerardo Majella

Vitor Alves, cientista político e internacionalista, também explica qual é a repercussão disso na discussão sobre a relação entre os dois países. Ele destaca a falta de manifestações diplomáticas oficiais sobre a rivalidade linguística. Organismos de padronização reconhecem ambas as variantes da língua portuguesa, mas a variante brasileira é a mais falada. O incômodo de conservadores, especialmente em Portugal, é perceptível, evidenciado por experiências pessoais de xenofobia.

“Por mais que esta não seja uma questão de contenda oficial entre Brasil e Portugal, é necessário ficar de olho, especialmente com a tendência crescente da imigração de brasileiros para Portugal (e o também-crescente número de casos de xenofobia contra os brasileiros emigrados)”
Vitor Alves
Um passado compartilhado

Ao invés de encarar essas batalhas como uma questão de meras vitórias ou derrotas, podemos vê-las como oportunidades para um entendimento mútuo entre duas sociedades moldadas por um passado compartilhado, numa relação colonizador-colonizado.

As relações entre Brasil e Portugal vão muito além da dimensão histórica. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, há um interesse mútuo em valer-se do capital político bilateral para aprofundar os fluxos de comércio e de investimentos e para criar novas parcerias nos campos científico, tecnológico, cultural e educacional.

Além disso, apesar das feridas coloniais expressas tanto online como offline, como preconceito e discriminação, a comunidade brasileira em Portugal é uma das maiores do mundo, estimada em cerca de 116.000 pessoas. É composta, sobretudo, por estudantes e profissionais liberais.

A língua comum é um facilitador de trocas culturais, o que permite atração e retração entre brasileiros e portugueses. Essa conexão linguística contribui para um ambiente propício à construção de laços mais estreitos entre as duas nações, não ignorando o passado e mirando em um futuro próspero de fraternidade, desenvolvimento e compreensão.

Se você deseja conhecer mais sobre os episódios de guerras memeais entre Brasil e Portugal, nossa equipe de redação selecionou os memes mais virais neste link.

35 comentários

  1. O mais triste nessa “Colonização Invertida” é ver portugueses desprezando brasileiros e a nossa cultura, ao invés de enxergar como uma soma.

    Enfim, matéria com ótimas reflexões

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  3. Muito excelente a análise que essa matéria realizou, ainda mais por se tratar de dois países que falam o mesmo idioma, ainda mais colonizador e colonizado. Arrasou, show!!

    • Excelente matéria muito rica de detalhes. É bom sempre aprender novos assuntos. Que para uns nem tão novos assim, mas que para outros saber que existe guerras até de memes, muito interessante. Mas o que deveria realmente acontecer era uma paz entre estas nações irmãs, ou posso dizer mãe e filha?!

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