Aratu online

A saga do macaco pernambucano que voltou dos mortos

Você já ouviu falar do macaco-prego-galego? Se não, não se sinta mal. Essa é uma das espécies de primatas mais raras e ameaçadas que existem no mundo. Também, uma das mais misteriosas, que vive na área que vai do sul do Rio Grande do Norte até o nordeste de Pernambuco. 

O animal foi descrito pela primeira vez em 1648 por um naturalista alemão que visitou o Brasil na comitiva de Maurício de Nassau. Mas, depois disso, o macaco-galego desapareceu da ciência por quase três séculos. 

Ele já foi confundido com outras espécies, teve seu nome científico mudado várias vezes e chegou a ser considerado extinto. Porém, a natureza adora surpreender. Em 2005 o peludo excêntrico ressurge para contar a sua história, após redescoberta por pesquisadores do ICMBio e da Universidade Federal da Paraíba, em fragmentos de Mata Atlântica do Nordeste brasileiro. 

Eles conseguiram confirmar sua identidade genética e morfológica, e o classificaram como Sapajus flavius, inaugurando um diferente subgênero para os macacos-prego. Desde então, os cientistas têm estudado essa espécie que revela muitas curiosidades sobre sua ecologia e seu comportamento.

O macaco-galego é um animal muito inteligente e sensível. Ele se comunica por sons e coordena o uso da floresta com outros macacos através das vocalizações. Essa forma primitiva de comunicação é essencial para resolver conflitos, como a distribuição de recursos, o aviso sobre potenciais ameaças e o reconhecimento das “hierarquias sociais”. Isso permite que compartilhem o habitat de maneira harmônica com outros primatas, como a família dos calitriquídeos, popularmente conhecidos por “sagui”. 

Sua inteligência fascina: ele forja e utiliza ferramentas na natureza, como galhos transformados em palitos, para extrair sua refeição de cupins, e coleta as secreções de milípedes (conhecidos por piolhos-de-cobra) para se livrar das muriçocas, como um repelente natural. Assim como os humanos, eles também expressam luto e tristeza diante da perda de um filhote ou companheiro, por exemplo, carregando seus corpos por semanas.

Esse primata desempenha um papel crucial no ecossistema da Mata Atlântica, pois sua contribuição se estende desde a disseminação de sementes até o controle de pragas, promovendo a riqueza da biodiversidade. A situação deles na natureza, no entanto, é lastimável. Diante de uma ameaça iminente de extinção, o macaco-prego-galego foi categorizado como “Em Perigo” pela União Internacional para Conservação da Natureza e já ocupou a posição de um dos 25 seres vivos mais vulneráveis do mundo.

O seu habitat natural está sendo destruído pela agricultura, urbanização e queimadas. O tráfico de animais e a busca pela sua pele também são motivos da sua desventura. A população remanescente, estimada entre mil e dois mil indivíduos, encontra-se fragmentada em 26 trechos de floresta. 

Projeções sombrias e modelagens alertam para um colapso do seu habitat, a Mata Atlântica, que perdeu mais de 80% de sua vegetação natural desde que os europeus chegaram ao Brasil. A corrida contra o relógio pela sobrevivência desse ser notável é, portanto, uma questão que clama por ações de preservação.

O lugar mais importante na conservação da espécie é a cidade de Igarassu, em Pernambuco, que resguarda uma das poucas populações do estado. Lá, existe um fragmento belíssimo no distrito de Três Ladeiras, onde os macacos-galego podem ser observados.

Por isso, é urgente proteger o macaco-prego-galego e seu ambiente. Algumas iniciativas já estão sendo feitas nesse propósito, como o Projeto Galego, da Universidade Federal de Pernambuco, que contribui com a formação de pesquisadores locais e tem ido de encontro com Plano de Ação Nacional para Conservação dos Primatas do Nordeste para preservação desse animal.

O macaco-prego-galego é um exemplo de resistência e adaptação, sobrevivendo a séculos de perseguição e esquecimento. Ele é um símbolo de beleza e inteligência, que surpreende quem o vê e precisa ser preservado como forma de reparação histórica, pensando na sustentabilidade da natureza. 

 

E aí, gostou? Que tal comentar sobre?