Segurança e pegada de carbono são as principais preocupações
Nos últimos anos, cresce a urgência de mudar a matriz energética global de fontes fósseis para renováveis, visando reverter um desastre climático. Os humanos, desde os primórdios, foram selecionados para sobreviver em ambiente hostis, resultando no desenvolvimento de habilidades cognitivas. Diante de um desastre iminente, surge a inteligência artificial (I.A.), sendo a maior aposta derivada do desejo de salvação da espécie.
No entanto, a I.A. é uma tecnologia controversa e imprevisível, com muitos desafios a serem enfrentados. Tratando-se de sua aplicação em energias renováveis, como a solar e eólica, ela apresenta poucos riscos éticos e sociais quando comparada com outros domínios, mas vieses em potencial podem estar nos códigos.
Por exemplo, usar I.A. para decidir quais indivíduos devem receber créditos de energia solar em compras — mecanismo usado para incentivar a transição energética, já realidade em alguns países — baseando-se puramente em padrões existentes em nossa sociedade, pode levar à manipulação de mercado num sistema baseado em lucro.
Também, o armazenamento de pequenas informações sobre demanda de energia individual ameaça a privacidade. Porém, considerando que a expectativa é de um aumento de 50% no consumo global de energia nas próximas duas décadas, é preciso correr para impedir um “autocídio” — que é quando uma espécie causa sua própria extinção.
A I.A. pode até ser uma aliada, como explica Alexandre Costa, diretor de Eólica, do Centro de Energias Renováveis da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “A maioria dos problemas encontrados têm sido tão complexos que é quase impossível ter resolução sem a ajuda de um computador”, afirma Alexandre.
Com a ajuda dos algoritmos, pelo menos se tratando na otimização da energia eólica, “os resultados obtidos são satisfatórios e o custo para execução, em geral, é baixo”, diz o diretor. Ele enxerga a inovação com positividade, mas defende que deve haver supervisão: “Com a I.A., a gente perde, essencialmente, a compreensão do comportamento natural das coisas, dificultando a interpretação dos resultados; o olhar humano, então, é necessário”.
Compreender a pegada de carbono da inteligência artificial envolve mais do que apenas monitorar os data centers da empresa responsável, já que todo o processo de produção e pós-produção de IA emite gases de efeito estufa. O setor de Tecnologia da Informação e Comunicação, do qual a I.A. faz parte, é responsável por 1,4% das emissões globais de gases de efeito estufa, e esse número pode chegar a 23% até 2030.
Se os números não parecem tão assustadores no cenário atual, só para ter uma ideia, durante o pré-treinamento do famoso Chat GPT, da Open AI, foram necessários usar milhares de petaflops por segundo — uma unidade de medida utilizada para descrever a capacidade de processamento de um supercomputador. Um petaflop realiza um trilhão de cálculos matemáticos em um segundo.
Assim, utilizando a calculadora de impacto de carbono desenvolvida por pesquisadores da Universidade de Montreal, no Canadá, e assumindo que o provedor de nuvem estava localizado nos Estados Unidos, calcula-se que um único treinamento do chatbot teria gerado de 223.920 kg (duzentos e vinte e três mil, novecentos e vinte quilos) a 279.900 kg (duzentos e setenta e nove mil e novecentos) de gás carbônico. Como ponto de referência, um carro popular emite cerca de 4600 kg de CO2 por ano, o que significa que um único treinamento emitiria tanto CO2 quanto 49 carros apenas na fase inicial.
Em síntese, é uma ferramenta que, em mãos erradas, usada da forma errada, ocasiona fracasso. Por isso, os governos, empresas e a sociedade precisam trabalhar juntos pela transparência e pela garantia do seu uso ético, aproveitando ao máximo suas vantagens sem comprometer o meio ambiente e a segurança das pessoas. Assim, um futuro sustentável, com energia limpa e renovável, pode ser alcançado apressadamente com a ajuda dos algoritmos e da responsabilidade.
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